Página Principal de Nilma Lacerda - escritora, pesquisadora e professora

Sobre a Obra

Grande escritora identificada

A pessoa cuja identidade legal, precisa, verdadeira, se ocultava atrás do pseudônimo da Silva, com o qual concorria ao primeiro prêmio Rio de Literatura, instituído pela Fundação Rio e a Editora Philobiblion, foi progressivamente ultrapassando todos os demais candidatos e por fim revelou-se merecedora de aprovação e escolha definitiva por unanimidade de votos dos 8 jurados. A autora de Manual de tapeçaria, que então se descobriu ser Nilma Gonçalves Lacerda, não era sequer conhecida por qualquer um deles, e seu nome não evocava a menor recordação da presença ativa no mundo das letras.

Por isso mesmo, a comissão julgadora se sentiu orgulhosa e satisfeita por ter chegado a consenso espontâneo naquele que vinha ser um dos mais limpos, dignos e isentos concursos literários já realizados no Brasil. Todos os seus integrantes se comoveram diante da descoberta de um talento invulgar, de uma indiscutível vocação para a criação ficcional. Tendo-se candidatado dentro de normas rígidas, rigidamente observadas, seu livro fora confrontado com mais de uma centena de outros e merecera o primeiro lugar sem nenhum favor ou concessão de natureza subalterna.

Nilma Gonçalves Lacerda comprovou ser, efetivamente, uma escritora amplamente senhora das artes et partes da carreira que abraçava, a partir desse romance que lhe assegura auspicioso futuro. Membro daquela comissão e exercendo há várias décadas sua profissão de editor, este articulista bem se dá conta de como é rara e gratificante, seja qual for a finalidade da leitura, a revelação de um verdadeiro escritor, como ocorreu no caso da autora de Manual de tapeçaria.

Manual de tapeçaria, que é um livro pessoal e muito bem escrito sem ser rebuscado, contemporâneo sem ser modernoso, revela antes de tudo a grande sensibilidade que Nilma Gonçalves Lacerda tem do mestiere di vivere, a que Cesare Pavese se referia como o leitmotiv de sua criação literária. Não sendo d’après, nem à la manière de qualquer outro autor, seu romance nos transmite pungente relato sociológico e antropológico de um determinado momento histórico brasileiro (e concomitantemente universal), em que as frustrações são mais fortes e autênticas do que as brilhantes utopias políticas com que nos acenam de todos os quadrantes, pois que originárias da injustiça e da prepotência inerentes à filosofias de vida norteadas antes pelo ter do que pelo ser.


–––––––––––––––––––––––––––––––

Ênio Silveira
(Posfácio na 2.ed. de Manual de tapeçaria, editora Revan, 2000.)
Rio de Janeiro: Letras & Artes, ano 1 - número 01 (Encarte do Jornal de Letras n. 420)
Novembro de 1986

Nilma Lacerda © Todos os direitos reservados | Fotografias e Webdesign: Maíra Lacerda Design